à grande e à francesa

Comigo é tudo à grande.

Sempre fui grande. Antes dos 10 anos já tinha de mostrar o BI para provar o meu direito a pagar meio bilhete nos transportes públicos. Era grande, portanto fui jogar basquete, actividade em que tive de ser também grande na dedicação, persistência e capacidade de lutar. Aos 12 anos, já tinha lido muitas obras de Eça e Camilo, o meu gosto pela leitura era grande. Também era uma grande parva, capaz de irritar treinadores, colegas e professores com um grau de insolência acima da média. Era grande namoradeira, de grande coração e grandes paixões e alguns grandes amores. Sempre fui uma grande amiga dos meus grandes amigos, ainda que a minha grande amizade tenha sido, por muitos anos, entregue a muito poucas pessoas. Fiz algumas grandes viagens, e vivi no Texas, onde tudo é verdadeiramente grande, até os pingos da chuva.
Um dia, consegui um grande emprego numa grande empresa. Trabalhei e continuo a trabalhar à grande e tenho-me saído bem.
Encontrei um amor maior e tive uma grande filha que mesmo antes de nascer já tinha dado um grande trabalho a fabricar em laboratório. Paguei uma grande nota por ela e pelos que nunca nasceram. Está cada vez maior, por fora e por dentro.
Nunca tinha estado doente, mas quando fiquei, foi logo com uma grande doença. Já com ela, ganhei novas grandes amigas. Antes de ser operada aos olhos, era uma grande, grande míope (7 dioptrias). E antes de ter feito uma redução mamária, tinha umas grandes, muito grandes, mamas que, anos depois, voltaram à grandeza inicial.
É grande o número que me aparece na balança pois é grande a falta de força de vontade, é grande a idade das velhotas da minha família, é grande a estupidez que não suporto em pessoas com que sou obrigada a compartilhar espaços e estradas, é grande a minha intolerância para com a intolerância, o racismo, a discriminação, a pobreza, a maldade, a intriga e, novamente, sempre ela, a estupidez. E também a mesquinhez e a ingratidão.
É grande a minha desorganização com a papelada, é grande a falta de disciplina para os bons hábitos, é grande o stresse em que vivo permanentemente, é grande o amor que tenho pelas pessoas de quem gosto. É grande a vontade que tenho de viver e grande a força que me surge quando é hora de lutar.

É tudo grande...
Mas nada é tão grande como o raio do preço dos comprimidos que ando a tomar. Hoje vim de Lisboa até casa com quase 5000 euros dentro de uma caixa de papel. Anda gente a fazer grandes descobertas, é verdade, mas a ganhar à grande com elas. Perante isto, não há como não me sentir pequena, pequena...

T.